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Rodrigo Mattos

Maioria das críticas ao Rio nos Jogos é correta, mas há exageros ridículos

rodrigomattos

27/07/2016 06h00

A proximidade da Olimpíada-2016 provoca uma avalanche de críticas ao Rio de Janeiro por parte da imprensa internacional. São justas? A maioria das notícias negativas retrata a realidade dos problemas da cidade, e é até benéfica para pressionar organizadores e governantes. Há, no entanto, exageros ridículos que cheiram a oportunismo.

A imprensa internacional presta um serviço à população carioca ao chamar a atenção para a sujeira na Baía de Guanabara e na Lagoa Rodrigo de Freitas. É vergonhoso que o Estado tenha fracassado na sua meta de conter 80% da poluição da baía onde ocorrerão os eventos de Vela.

Por isso, velejadores estarão, sim, submetidos a navegar sobre detritos e uma água contaminada. Em menor escala, os remadores e canoístas enfrentarão águas sujas e assoreadas na lagoa.

Agora, é no mínimo falta de bom senso do "New York Times" comprar sem contestação a tese de um pesquisador brasileiro – com largo currículo, diga-se – de que nadadores estarão "nadando em merda" e correm "risco de ser infectados" na praia de Copacabana. Há uma controvérsia sobre a questão desde que a AP patrocinou testes nesta água e achou a presença de vírus. As medições do governo estadual para coliformes fecais mostram índices normais, e a OMS (Organização Mundial de Saúde) diz que a água é segura.

Na vida real, milhões de pessoas mergulham em Copacabana no ano inteiro. A água às vezes tem muitos detritos, às vezes está bem limpa – falo por experiência própria. Mas não há nenhum relato de contaminação por vírus em larga escala na praia. Nem por autoridades de saúde, nem por jornais brasileiros. Se houvesse real ameaça à saúde de atletas, haveria à população. Como se explica que nada aconteceu até agora? Não ocorreu essa pergunta ao jornalão norte-americano?

Em seguida, há a questão da segurança. Os índices de criminalidade no Rio têm piorado mês a mês com a falência moral e financeira do governo do PMDB do Estado. Mais uma vez, a imprensa internacional presta um serviço à população carioca ao apontar essas falhas. É provável que em termos de criminalidade os Jogos sejam seguros com excesso de exército e soldados nas ruas. Depois, a população estará entregue ao PMDB novamente.

Mas nada explica uma reportagem como a do "USA Today" que cita, sem contestação ou checagem de dados, um pastor evangélico que diz que 40% da população das favelas da cidade usa crack. Sim, essa é a fonte estatística do jornal: um pastor (nada contra pastores, mas duvido que eles tenham dados corretos sobre uso de drogas na cidade). Assim, ilustram uma reportagem em vídeo em favela perto do Maracanã com viciados.

A população de favelas do Rio gira em torno de 1,4 milhão e 2 milhões de pessoas, dependendo do levantamento. Levando-se em conta o número mais baixo, o Rio teria 560 mil viciados em crack, ou quase 10% da população urbana. Seria uma legião de zumbis causando o caos pela cidade. Será que o jornal não percebe que o dado não faz sentido? Ou o objetivo é soltar a informação e impressionar seu leitor sem se importar com a sua veracidade?

Outra polêmica gira em torno do zika. A contaminação pela doença é obviamente um problema de saúde sério, e de difícil solução para a população brasileira. O risco de infecção no inverno, no entanto, é muito baixo, segundo a OMS. Ou seja, nós brasileiros sofreremos, e quem vem aos Jogos, não.

Então o que leva uma goleira como Hope Solo, dos EUA, a tirar uma foto com máscara de proteção como se enfrentasse abelhas assassinas na véspera de sua viagem? Ou a golfistas dizerem que não irão aos Jogos pelo mosquito? Cheira a oportunismo, e é. Atletas como Michel Phelps, por exemplo, que se informaram, minimizaram o risco de contaminação.

Por fim, as críticas de australianos e outras delegações a organizadores dos Jogos são, até o momento, absolutamente pertinentes visto que o Rio-2016 falhou ao entregar a primeira instalação aos atletas: sua casa, a Vila. É um vexame que a obra estivesse inacabada, e o comitê organizador tenha deixado para a última hora para testá-la. A ver como estarão as sedes de competições.

O Rio tem muitos defeitos a serem sanados, assim como possui qualidades. Quem vem de fora e aponta os erros reais ajuda a cidade a se entender, e a tentar se consertar. Quem opta por exageros sensacionalistas só demonstra a própria ignorância.

Sobre o Autor

Nascido no Rio de Janeiro, em 1977, Rodrigo Mattos estudou jornalismo na UFRJ e Iniciou a carreira na sucursal carioca de “O Estado de S. Paulo” em 1999, já como repórter de Esporte. De lá, foi em 2001 para o diário Lance!, onde atuou como repórter e editor da coluna De Prima. Mudou-se para São Paulo para trabalhar na Folha de S. Paulo, de 2005 a 2012, ano em que se transferiu para o UOL. Juntamente com equipe da Folha, ganhou o Grande Prêmio Esso de Jornalismo 2012 e o Prêmio Embratel de Reportagem Esportiva 2012. Cobriu quatro Copas do Mundo e duas Olimpíadas.

Sobre o Blog

O objetivo desse blog é buscar informações exclusivas sobre clubes de futebol, Copa do Mundo e Olimpíada. Assim, pretende-se traçar um painel para além da história oficial de como é dirigido o esporte no Brasil e no mundo. Também se procurará trazer a esse espaço um olhar peculiar sobre personagens esportivas nacionais.