Olimpíada deixa Rio mais feliz, mas não vai transformá-lo
Foi a melhor Olimpíada, foi a pior Olimpíada, foi o tempo da euforia, foi o tempo dos lamentos, foi a época do orgulho, foi a época do vexame, foi o período da compreensão, foi o período das críticas, foi o momento da solidariedade, foi o momento da arrogância, nós tínhamos tudo a nossa frente, nós não tínhamos nada a nossa frente.
A percepção brasileira sobre os Jogos Rio-2016 é marcada por extremos. O que de início era ataque pesado, depois virou exaltação, o que era receio de um desastre, depois virou entusiasmo cego, o que antes era complexo de vira-lata, depois virou nacionalismo exacerbado.
Mas os exageros, em geral, turvam a análise do que representou de fato a Olimpíada para a cidade e para o Brasil. Qualquer crítica pertinente será vista como mau humor após o país conquistar duas medalhas de ouro nos seus dois principais esportes coletivos. Assim como qualquer elogio preciso seria ignorado quando havia uma Vila Olímpica inacabada e australianos aos gritos.
Analisada de uma melancólica manhã de segunda-feira, a Rio-2016 foi um fator de recuperação da auto-estima da cidade e em menor escala do Brasil, mas ao mesmo tempo não os transformou em um lugar melhor. Fomos felizes por duas semanas apesar dos percalços. O sonho de apresentar um país diferente ao mundo, que existia na candidatura de 2009, ficou pelo caminho.
Não há dúvida da beleza da festa de abertura que mostrou um face brasileira de gente feliz, elegante e sincera. Nem há questão de que o país se torna melhor quando tem uma herói simbólica como Rafaela Silva, saída ali da Cidade de Deus, pertinho do Parque Olímpico. E há, sim, uma sensação de realização do carioca e brasileiro ao concluir um projeto de sete anos e receber os estrangeiros para os Jogos.
A realidade, no entanto, é que o Rio não foi capaz de demonstrar a mesma competência que cidades desenvolvidas como Pequim, Londres e Sydney na organização do evento. Houve falhas, sim, contundentes desde o vexame da Vila Olímpica até uma operação desastrada nos serviços ao público. Ou seja, o Brasil não mudou a sua face do jeitinho.
Em relação ao Rio, vale a mesma leitura. O prefeito Eduardo Paes conseguiu, com os Jogos, criar um sistema de transportes que demonstra eficiência nestes primeiros dias de operação. Isso é um ganho para a população carioca. E mudou o visual do centro da cidade com a revitalização do porto.
Só que a transformação como em Barcelona, promessa de campanha, não se concretizou. O Rio é hoje em termos de segurança pior do que era em 2009, e esse é o problema que mais aflige o carioca. E as águas da Baía de Guanabara e da Lagoa Rodrigo de Freitas continuarão a ser quase tão sujas quanto antes. Sem esquecer que as obras olímpicas foram realizadas com o mesmo modus operandi nocivo que é hábito no país.
Ninguém vai esquecer de Usain Bolt na pista do Engenhão, de Micheal Phelps na piscina, do primeiro ouro olímpico da seleção explodindo o Maracanã, da festa familiar do vôlei, do salto improvável de Thiago Braz, das piadas, dos vilões, dos casos polêmicos. Foi uma festa para contar para os netos. Agora, é hora de encarar a ressaca e pensar sobre as oportunidades perdidas neste Jogos. Enfim, é segunda-feira.
PS O primeiro parágrafo deste texto é inspirado na introdução do livro "Um conto de duas Cidades" de Charles Dickens que trata da época das transformações provocadas pela Revolução Francesa, e do cenário de Londres na mesma época.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.