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Rodrigo Mattos

Sem política da Caixa, futebol tem que dar retorno, diz dirigente vascaíno

rodrigomattos

07/09/2019 04h00

Há um ano e sete meses no Vasco, o vice-presidente de marketing, Bruno Maia, iniciou seu trabalho com o clube com uma das imagens mais desgastadas do futebol brasileiro após anos associado ao ex-dirigente Eurico Miranda. E o novo presidente Alexandre Campello chegava ao poder de forma controversa em eleição indireta no Conselho. Ao mesmo tempo, o mercado de patrocínios no Brasil estava em declínio.

Diante deste cenário, o clube cruzmaltino voltou a conseguir parcerias comerciais, embora abaixo do seu potencial pelo tamanho da torcida. De uma certa forma, foi reintroduzido no mercado ainda em baixa.

Em entrevista ao blog, Bruno Maia explica quais estratégias utilizou durante esse período. Sua análise é que, para além do problema particular do Vasco, há uma questão estrutural no futebol brasileiro exposto pela saída da Caixa Econômica do mercado.

Para ele, o banco não tinha um patrocínio, mas uma política pública. Sem um apoio quase estatal, resta ao Vasco e aos outros clubes passarem a entregar resultados aos seus patrocinadores para garantir receita, sem ter garantia mínimas altas. É assim nos acordos vascaínos do BMG e Netbet do clube – o clube só tem R$ 8 milhões garantidos por dois anos pelo BMG.

Blog: Do momento que você entrou até hoje, o que entende que foi a maior dificuldade e o que entende que conseguiu fazer?

Bruno Maia: A maior dificuldade continua que é estrutural que todos os clubes passam, de como está o futebol brasileiro dependente de recursos. A estrutura de como o mercado de marcas que não acredita no futebol. Você veja nas camisas que são poucos segmentos que estão. Esse tipo de coisas são as mais difíceis. Você por mais que tenha uma tentativa de mudança de imagem do clube que é o que tentamos fazer: têm coisas que levam mais tempo para conseguir. Você vê o Flamengo evidentemente que conseguiu fazer, é o grande case do futebol brasileiro, mas ainda é um projeto que tem estruturas que são difíceis de ser mantidas. Flamengo tem tentado diminuir a dependência da televisão, mas ainda é um volume muito grande. Tinha uma patrocinador estatal que saiu, Vasco também tinha. Tudo isso afeta projetos mais bem sucedidos. E tem muito dever de casa para fazer dentro dos clubes, mas a maior dificuldade segue sendo estrutural.

Blog: No caso específico do Vasco, quando você chegou pela primeira vez para negociar parceria comercial, a imagem que tinha do Eurico como afetava?

Bruno Maia: Nunca era mencionado. O que existia era um desgaste da imagem do clube que se confunde um pouco pela personificação da imagem do Eurico e por anos de má performance esportiva e aumento de dívidas. Isso tudo somava algo que eu nunca vi personificado em um nome por mais que o nome do Eurico seja forte. O que tinha era um afastamento, era não existir contato. As pessoas ligavam e não sabiam com quem falar. As pessoas que estavam no marketing antes de nós, acho que fizeram um grande trabalho diante das dificuldades. Havia esforços para que a coisa acontecesse, mas existia um distanciamento.

Blog: Mas em relação ao clube (havia desgaste)?

Bruno Maia: Tinha uma diferença de olhar, tinha. Isso nunca foi escondido na gestão, de entender como o Vasco deveria ser. Campello sempre dizia isso desde o dia 1, o que passou, a imprensa já colocou, passou. Torcida sabe o que é e os traumas. Quando entra no Vasco, a principal função é resolver coisas, gerar receita. Você vê que houve muita crítica que tínhamos muito patrocínio pontual. Sim, tínhamos um contrato com a Lasa que não se confirmou que era master. Não podia prospectar outro durante um tempo porque daria direito de rescisão para eles. Perdemos tempo de negociação. Quando estava liberado, já era março e não dava para voltar com a Caixa por conta de falta de CND. Não tinha para onde ir. Íamos tentar minimizar por jogo. Minimizamos isso conseguindo 60% ou 70% do patrocínio master com pontual. O que considero bem sucedido e passamos a ter retomada de contato comercial de mercado, retoma uma circulação que teve importância esse ano para ter um crescimento expressivo de receitas do marketing em relação ao que houve no ano 1. Tivemos quase 30 marcas. Por um lado, pode falar é a prostituição da camisa. Por outro, podemos falar, é a retomada de relacionamento comercial.

Blog: Quando vocês fecharam com  o BMG neste ano, em um modelo parecido com outros clubes, com esse modelo variável. Como está funcionando? Temos ouvido relato dos próprios torcedores de alguma dificuldade quando querem se engajar no projeto de entrar.

Bruno Maia: A maior dificuldade é cultural. Temos um processo no esporte do Brasil de profissionalização e isso passa pela responsabilidade dos clubes de dar resultado. Estamos vindo de um momento em que a exposição de marca estava supervalorizada na camisa porque tinha o agente dominante (Caixa Econômica) que não tinha obrigação de dar resultado porque era uma política pública.

Blog: Não era o discurso da Caixa…

Bruno Maia: Mas é uma leitura possível. É bem diferente uma Caixa em relação a bancos startups que têm obrigação de dar resultado. Mas você pode ganhar muito mais. Os clubes têm capacidade de fazer essa receita. Se pegar quanto os clubes ganhavam, são valores factíveis de conseguir com obtenção de resultado

Blog: Mas nenhum clube está conseguindo até agora…

Bruno Maia: Não está conseguindo porque está em um momento de mudança de cultura. Falando em comentário genérico, qualquer clube que tem base grande de sócio-torcedor e é eliminado, o que acontece? Despenca. Naquele momento, e depois volta. Nossos resultados estão muito atrelados ao desempenho esportivo. Veja o resultado que o Banco Inter teve após a contratação do Daniel Alves. Você cria gatilhos que disparam algumas coisas. Torcedor ainda é muito passional e recebe poucos benefícios, isso também é verdade. Ele tem pouca clareza se aquele dinheiro que fala que está indo para o futebol está indo mesmo para o futebol. "Que dinheiro é esse que estou botando no BMG e está indo para o Vasco está onde se o clube está cheio de dificuldade financeira?" Ele desconfia. É um processo de longo prazo. Quando os sites de apostas entrarem no Brasil, vão fazer a mesma coisa. Vão ter essa abordagem de querer que os clubes participem.

Blog: Talvez os sites de apostas nem precisem dos clubes.

Bruno Maia: Precisam para caramba. Já houve… Temos patrocinador de site de apostas. Nós temos um acordo com a NetBet que torcedores que se convertem pela base do Vasco e o Vasco ganha receita em cima do resultado deles. Como foi apresentado? O Vasco tem um fixo e isso é um variável adicional que tem o contrato e que se você consegue gerar receita adicional ganha em cima disso. Tem outros contratos maiores que você tem capacidade maior de entrega de resultado, e que tem participação maior de entrega de resultados. Tem a garantia mínima, e vai construir em cima de resultado. Nosso acordo com o BMG e com Netbet não são muito diferentes que o Vasco ganha em cima do gatilho dos produtos. O que está em cheque é que os bancos digitais vieram em um momento de quebra, de bancos que pagavam patamares muito altos, para ninguém pegar. Tanto é que nenhum outro segmento entrou quando a Caixa saiu, só o segmento bancário. Bancos novos, de grupos antigos.

Blog: O mercado brasileiro de patrocínio de fato é bem restrito a bancos.

Bruno Maia: O mercado de futebol pegou a saída de um player (Caixa), pega uma queda do mercado de 20% como mostrou o relatório do Itaú BBA (de 2017 para 2018). E nesse ano vai ser igual. O Flamengo por exemplo ficou quatro meses sem patrocínio. Saiu de R$ 25 milhões para R$ 15 milhões pelo que dizem. Onze clubes da Série A têm como patrocinador banco com renda variável, isso vai cair para todo mundo. Acho que a receita pode cair mais do que 20%. O mercado de futebol está se reposicionando, além do mercado como um todo. Minha agência faz contrato também por entrega de resultado. Ainda assim, acho que o futebol é um produto subvalorizado. Você fala que estava supervalorizado porque havia apenas um player pagando e não era real aquilo. Tanto que não saiu um e entrou o outro. O potencial dele é muito maior.

Blog: Como está o Vasco em relação à meta de orçamento de patrocínio que havia que era em torno de R$ 30 milhões?

Bruno Maia: Não é uma meta o orçamentária. O que temos é um planejamento financeiro, o departamento financeiro do clube, que cada área tem uma contribuição de fluxo de caixa. Aí vai entrar em uma discussão contábil que não tenho capacidade para discutir os termos. De fluxo de caixa, em relação, R$ 35 milhões ou R$ 40 milhões (tem como meta).

Blog: E ficou abaixo no primeiro semestre?

Bruno Maia: O balancete não fala de fluxo de caixa. Ele fala de apropriação contábil. A meta é de fluxo e não contábil. O que posso dizer é que o resultado que prometeu em um ano todo. E pode ter acordos que ainda não foram pagos ainda o que não significa que ainda não está fechado. Maior parte dos patrocínios é pago em parcelas.

Sobre o Autor

Nascido no Rio de Janeiro, em 1977, Rodrigo Mattos estudou jornalismo na UFRJ e Iniciou a carreira na sucursal carioca de “O Estado de S. Paulo” em 1999, já como repórter de Esporte. De lá, foi em 2001 para o diário Lance!, onde atuou como repórter e editor da coluna De Prima. Mudou-se para São Paulo para trabalhar na Folha de S. Paulo, de 2005 a 2012, ano em que se transferiu para o UOL. Juntamente com equipe da Folha, ganhou o Grande Prêmio Esso de Jornalismo 2012 e o Prêmio Embratel de Reportagem Esportiva 2012. Cobriu quatro Copas do Mundo e duas Olimpíadas.

Sobre o Blog

O objetivo desse blog é buscar informações exclusivas sobre clubes de futebol, Copa do Mundo e Olimpíada. Assim, pretende-se traçar um painel para além da história oficial de como é dirigido o esporte no Brasil e no mundo. Também se procurará trazer a esse espaço um olhar peculiar sobre personagens esportivas nacionais.