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Rodrigo Mattos

Arena do Palmeiras será uma Bombonera em relação a Itaquerão, diz arquiteto

rodrigomattos

16/09/2014 06h00

Arquiteto da Arena Palmeiras, prestes a ser inaugurada, Edo Rocha classifica a execução do estádio como um "milagre". Explica-se: a área reduzida exigiu um esforço extra para torna-lo moderno ao contrário de outros que contam com largos espaços. Não foi possível, por exemplo, atender todas as exigências da Fifa em relação à área externa de circulação.

Em compensação, a solução encontrada para a arquitetura é classificada por Rocha como aconchegante. Ele compara com o Itaquerão que tem os fundos abertos: afirmou que a Arena Palmeiras manterá muito mais o som dentro do estádio. Chega a comparar o efeito com o da Bombonera, tradicional casa do Boca Juniores, exaltada pela pressão da torcida. Veja a entrevista com o arquiteto feita pelo blog:

Blog – Foi possível atender todas as requisições da Fifa na Arena Palmeiras?

Edo Rocha – Está mais ou menos adaptado às normas da Fifa. Algumas requisições não dava para fazer. Não é um problema de caro, não dava para fazer no espaço disponível. Foi um milagre a transformação do estádio antigo no que se tornou. Por dois sites internacionais, foi dado prêmio. Foi um milagre o que já se fez. A Fifa tem um modelo que é construção em um espaço novo.  

Blog – Como você fez para equilibrar as requisições para shows que têm um público neutro e dos jogos em que será a casa do Palmeiras? Qual a diferença para os estádios públicos?

Rocha – Um estádio público recebe de 30 a 35 jogos por ano, pode ter alguns com números maiores. O custo de um estádio novo gera uma conta em que é preciso ter outras atividades. Então, é o problema de um ativo depreciado como o Pacaembu. Um estádio novo, ele precisa ser lucrativo. O ideal seria ele estar preparado para outros eventos. A gente tem uma solução que pode fazer um show de 12 mil pessoas, onde ele era fechado. Você pode fazer um show para todos que dá 60 mil pessoas. E faz jogo para 48 mil pessoas. Tenho três em um. Um dia para a transformação.

Blog – Como chegou a solução encontrada na Arena Palmeiras para as transformações?

Rocha – Tinha outras ideias iniciais. O ideial era ter uma estrutura que sai do chão e levanta o palco. Mas o Rolling Stones quer de um jeito, o Pavarotti quer do outro. Não é só o artista, mas são todos os tipos de eventos que a gente não pode prever. Então, essa é a solução mais viável (com montagem e desmontagem do palco de acordo com o evento).

Blog – Como o plano de negócios influenciou o projeto?

Rocha – Esse plano é a partida, o início do programa que interfere no estádio. Parte de um programa e de uma viabilidade financeira para transformar um produto em uma coisa economicamente viável. Sem dúvida, o plano de negócios determinou como seria o programa de construção. Foram atendidos os pedidos feitos pelo cliente. 

Blog – Houve algum estádio que serviu como inspiração? 

Rocha – Tem uma série de normas da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas). Trabalhou-se criativamente. Não teve inspiração. Faço muitas coisas de clubes. Esse foi um projeto mais ou menos harmonizado de forma particular. Essa estrutura toda que foi montada é como um grande cesto, ninho. Ninho da China (Ninho de Pássaros, estádio olímpico de 2008) é uma referência, mas esteticamente não tem uma ligação. A ideia de ter a palavra ninho é a referência. É essa trama, esse cesto do estádio que é a ideia. Que seja aconchegue e seja acolhedora. Por exemplo, o Itaquerão entra vento dos lados e então é um problema. A ideia é mais uma Bombonera, como um lugar de touradas. O som é uma energia que escapa. Se a gente não controla essa energia, ela vira um problema, vai andando. Acaba com essa energia. Jamais poderia fazer um estádio aberto naquele lugar. Todo o trabalho de acústica foi pensado e refletido para ter repercussão pensando no que está em volta. Todas as chapas metálicas, a perfuração randômica correta. A gente faz estúdios da Globo e da Record e mexemos muito com essa parte das emissoras. Alguns princípios de acústica foram pensados no revestimento. O som, quando passa pelas lâminas, tem frequência mais confortável. É um liquidificador da frequência. Quando você ouve o som do vento na mata, cria um som que tem harmonia da frequência. Na cidade, tem outro efeito e dá irritação. A tentativa é que a voz humana que está lá dentro, a partir do momento que passe no filtro, tenha um efeito melhor.

Blog – E o efeito dentro do estádio?

Rocha- Dentro do estádio, há a característica de como foi feita a qualidade da acústica interna. Estamos falando de reverberação. Preciso ter um lugar dentro do estádio… Se você vai em um anfiteatro grego, com a qualidade da reverberação, o cara ouve no final o que acontece. A gente não consegue fazer um teatro grego. Porém, muitas das coisas de acústicas são calculadas e pensadas para isso. Acho que deu muito certo. 

Blog – Dá para fazer uma comparação com o antigo estádio do Parque Antarctica em relação ao som da torcida?

Rocha- Não consigo te dizer isso (Palestra). Vai ser melhor do que o Pacaembu, o Morumbi. Estive no Mineirão e era confuso. Quando o Palmeiras estiver pronto, você me diz com a memória (sobre o Parque Antarctica). Tem que estar com a casa cheia. Acho que deve ser dez vezes melhor. A parte de qualidade do áudio é excepcional.

Blog – A decoração teve que buscar equilíbrio para o público neutro que vai a shows?

Rocha- Vai ficar bonito e muito elegante. A gente não pode ser agressivo, ofensivo, nem ter overdose (de símbolos do Palmeiras). Tem que ser uma coisa correta, elegante, dentro da escala humana. Evitar essa coisa da poluição visual que já vivemos (no dia a dia). Buscamos um equilíbrio dessa decoração. Estão de uma forma discreta (os símbolos do Palmeiras), bastante civilizada. As cadeiras todas são em três tons de verdes. Fazem parte de manchas. É um pouco essa ideia da mancha verde da torcida com parte mais gráfica da proporção das  cadeiras e do gramado. Quase como se fosse uma extensão do gramado. Quase como uma mata vista de cima. Cheguei a fazer palmeiras, a grafia era muito bonita. Eram duas alternativas, e foi feita a alternativa que era a primeira ideia. Às vezes tem-se uma ideia, e tem uma segunda, mas volta-se à primeira. Desse jeito, você enxerga melhor.

Blog – E como a parte prática do funcionamento de um estádio influenciou o projeto?

Rocha– Há a estética e o funcionamento. Alguns reclaman que eu tirei a calota que sustentava o telhado. Tinha pensado em cobrir aquela estrutura. Quando desenhou a estrutura, ficou mais high tech. Mudei o material de fora que antes seria alumínio para aço inox. Tem alguns momentos que você tem que fazer algumas mudanças no projeto. É a função que mais acomodada as entradas e saídas e da proporção. Quando quer comparar o projeto, o projeto da Fonte Nova também foi adaptada ao antigo com solução interessante. Cada caso e cada projeto é um. O que podemos definir é se agrada mais as pessoas.? Ele atende as funções. O Palmeiras atinge melhor para shows e jogos, a forma do Itaquerão só atinge o futebol, talvez a função do clima interno (do Itaquerão) não seja boa. Não é crítica. São soluções que foram dadas. Não venho botar a culpa em uma coisa ou outra.

Blog- E como os atrasos da obra afetaram o seu trabalho? 

Rocha- O grande drama do projeto demorar é porque entra o "ja que estamos fazendo isso…". Quando entra isso, dançou. Alteramos e melhoramos algumas coisas. Por um lado, isso às vezes é bom. Ajuda a ajustar uns detalhes que puderam ser melhorados. Não houve grandes alterações. Houve ajustes normais como uma obra como qualquer outra. Toda obra sofre alguns ajustes, pequeníssimos ajustes. Tem uma coisa muito interessante. Dentro de uma obra de arquitetura ou de arte, existe aquilo que o arquiteto e artista desenhou. Ou ela fica melhor ou pior do que imagina. Na Arena Palmeiras, houve boa resposta. Ficou muito melhor do que tinha como expectativa. Tivemos condição de amadurecer. Ganhamos dois prêmios de arquitetura. Quando funcionar, estiver cheia, vai ter outra percepção do público. As comparações começam a fazer sentido. Uma coisa é a minha visão e outra é a do público.

PS: O Itaquerão também teve sua arquitetura pensada para maximizar o som da torcida, e minimizar o efeito externo do som. A ideia do projeto é de que duplicaria o som da torcida no PacaembuPara isso, foram usadas quatro camadas de revestimento na cobertura para o som voltar para o campo, além de deixar o torcedor mais próximo do gramado. Ressalte-se que uma parte da cobertura ainda não está pronta, o que deixa incompleto o sistema.

Sobre o Autor

Nascido no Rio de Janeiro, em 1977, Rodrigo Mattos estudou jornalismo na UFRJ e Iniciou a carreira na sucursal carioca de “O Estado de S. Paulo” em 1999, já como repórter de Esporte. De lá, foi em 2001 para o diário Lance!, onde atuou como repórter e editor da coluna De Prima. Mudou-se para São Paulo para trabalhar na Folha de S. Paulo, de 2005 a 2012, ano em que se transferiu para o UOL. Juntamente com equipe da Folha, ganhou o Grande Prêmio Esso de Jornalismo 2012 e o Prêmio Embratel de Reportagem Esportiva 2012. Cobriu quatro Copas do Mundo e duas Olimpíadas.

Sobre o Blog

O objetivo desse blog é buscar informações exclusivas sobre clubes de futebol, Copa do Mundo e Olimpíada. Assim, pretende-se traçar um painel para além da história oficial de como é dirigido o esporte no Brasil e no mundo. Também se procurará trazer a esse espaço um olhar peculiar sobre personagens esportivas nacionais.