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Rodrigo Mattos

Caixa socorre Odebrecht ao antecipar R$ 240 mi da Vila Olímpica

rodrigomattos

21/10/2016 06h00

A Caixa Econômica Federal deu um socorro financeiro para as empreiteiras Odebrecht e Carvalho Hosken durante a construção da Vila Olímpica dos Atletas. Obtido pelo UOL Esporte, o contrato do financiamento entre as partes foi alterado para permitir uma liberação antecipada de R$ 240 milhões para as construtoras em troca de imóveis como garantia. Isso ocorreu sem que o consórcio tivesse cumprido sua meta de venda prevista para receber esse dinheiro.

O Ilha Pura (consórcio formado pela Odebrecht e a Carvalho Hosken) alega que o desembolso antecipado foi necessário para a conclusão do empreendimento para a Olimpíada. E defende que foi uma operação normal no mercado imobiliário.

Para entender o negócio, é preciso voltar à negociação que tornou o condomínio de 31 prédios a moradia dos atletas durante a Olimpíada. Houve um acordo entre a prefeitura do Rio, as empreiteiras e o Comitê Rio-2016 para que o projeto ficasse pronto antes dos Jogos. O município faria obras de infraestrutura nos arredores, e a Caixa faria o financiamento.

A negociação entre o Ilha Pura e o banco estatal não foi fácil e demorou a se concluir. As empreiteiras alegam que a Caixa foi bem dura nas exigências e as condições de financiamento foram padrão, sem facilitação. Assim, só foi assinado um contrato em abril de 2014 quando cerca de 40% das obras já estavam executadas com recursos das empreiteiras.

Pelo documento, seriam liberados R$ 2,330 bilhões pela Caixa para o Ilha Pura. Como garantia, eram dados em hipoteca imóveis do próprio condomínio em um total de R$ 2,9 bilhões, o que representava 123% do dinheiro. Além disso, o Ilha Pura cedeu todas as suas ações para a Caixa em alienação fiduciária. O montante seria liberado conforme a execução das obras.

Mas havia uma outra garantia para dar segurança à Caixa. Pela cláusula 5ª do contrato, foi estabelecida a retenção de R$ 240 milhões das duas parcelas iniciais do financiamento da obra. Esse dinheiro só poderia ser liberado quando a Ilha Pura atingisse a venda de R$ 921 milhões dos apartamentos. Desta forma, o banco estatal estaria protegido contra um possível fracasso do empreendimento. Afinal, tinha imóveis e ações do consórcio como garantia.

Pois bem, em julho de 2015, foi assinado um aditivo do contrato. Nele, ficou estabelecido que os R$ 240 milhões seriam liberados antes de a meta ser atingida. Em troca, a Carvalho Hosken fornecia imóveis que "possuem o valor de custo equivalente" ao montante, diz o contrato. O consórcio defende que os imóveis valem mais. Os apartamentos em garantia não podem ser vendidos até se atingir o patamar de R$ 921 milhões em vendas.

O consórcio Ilha Pura disse que pediu a modificação porque não tinha conseguido vender a meta de apartamentos e necessitava do dinheiro para finalizar os condomínios a tempo da Olimpíada.

"Sim, a Ilha Pura propôs à CEF uma substituição desta garantia, a fim de dar liquidez ao projeto e viabilizar a conclusão das obras, atendendo assim aos prazos assumidos no compromisso olímpico. A razão desta modificação foi a ruptura no cenário econômico, o que consequentemente, refletiu no mercado imobiliário", contou a assessoria do Ilha Pura.

O consórcio não sabe informar qual foi o valor de vendas até agora, mas foram negociados 40% dos 600 apartamentos postos à venda. A alegação das empreiteiras é que a crise econômica impactou o mercado imobiliário.

Sob o ponto de vista da Caixa, o dinheiro representava uma garantia real mais consistente. Pela regulação de bancos, as instituições bancárias podem ter imóveis no caso de hipotecas de empréstimos, mas têm que comercializá-los em até um ano. É comum que bancos tenham que vender apartamentos abaixo do preço por essa exigência. Isso se agrava em um cenário de recessão do mercado imobiliário, ou seja, o banco assume parte do risco que era da empreiteira.

O Ilha Pura nega que seu objetivo tenha sido transferir risco: "Não, o objetivo foi dar liquidez necessária ao projeto, de modo a viabilizar sua conclusão dentro dos prazos firmados no compromisso olímpico." O consórcio entende que, a longo prazo, o mercado imobiliário vai se recuperar e todos os apartamentos serão vendidos.

A Caixa se recusou a comentar o caso:  "Com relação à Vila dos Atletas, a Caixa Econômica Federal informa que se tratam de operações de mercado protegidas por sigilo bancário, conforme prevê a Lei Complementar no 105/2001."

Com a liberação antecipada, o Ilha Pura já recebeu o total dos R$ 2,3 bilhões da Caixa. Com o direito a carência, pagou apenas juros de abril de 2014 a março de 2016. Dessa data em diante até março 2017, o Comitê Rio-2016 pagou os juros como aluguel pelo período. Só a partir daí é que o consórcio começará a pagar a dívida principal com a Caixa. O consórcio não revela quanto pretende lucrar com o condomínio: alega que não divulga suas receitas.

Lembrança: o Ilha Pura entregou a Vila Olímpica no prazo, mas com vários problemas de acabamentos. Como o Comitê Rio-2016 demorou a perceber essas falhas, isso afetou as delegações de atletas em sua chegada para a Olimpíada.

Sobre o Autor

Nascido no Rio de Janeiro, em 1977, Rodrigo Mattos estudou jornalismo na UFRJ e Iniciou a carreira na sucursal carioca de “O Estado de S. Paulo” em 1999, já como repórter de Esporte. De lá, foi em 2001 para o diário Lance!, onde atuou como repórter e editor da coluna De Prima. Mudou-se para São Paulo para trabalhar na Folha de S. Paulo, de 2005 a 2012, ano em que se transferiu para o UOL. Juntamente com equipe da Folha, ganhou o Grande Prêmio Esso de Jornalismo 2012 e o Prêmio Embratel de Reportagem Esportiva 2012. Cobriu quatro Copas do Mundo e duas Olimpíadas.

Sobre o Blog

O objetivo desse blog é buscar informações exclusivas sobre clubes de futebol, Copa do Mundo e Olimpíada. Assim, pretende-se traçar um painel para além da história oficial de como é dirigido o esporte no Brasil e no mundo. Também se procurará trazer a esse espaço um olhar peculiar sobre personagens esportivas nacionais.