Como saúde financeira dos clubes melhoraria nível do futebol brasileiro
A temporada de 2018 começou com boa parte dos clubes brasileiros em crise financeira logo após estes mesmas agremiações terem sido beneficiadas com um programa para pagamento de dívidas e luvas de televisão. Uma novela repetida em que dirigentes preferem investir pesado no futebol a adotar regras básicas empresariais. O que falta de compreensão aos cartolas brasileiros é que, a longo prazo, uma recuperação das contas se refletiria em melhoria técnica em campo.
Para explicar isso, é preciso lembrar que o mercado de futebol do Brasil ainda é pouco regulado em termos de finanças em relação a outras ligas europeias. A CBF instituiu um licenciamento para clubes para 2018 sem que exista nenhum regra de fair play financeiro, isto é, que puna aqueles que gastem sem ter dinheiro. Isso já existe na Europa e na Ásia. No Brasil, só há é a Lei do Profut que prevê exclusão do refinanciamento.
Pois bem, a Alemanha é o país onde há talvez a maior regulação financeira dos clubes. Por isso, é uma liga que gasta bem menos com contratações de jogadores do que as outras, como a Inglesa ou Espanhola. A exceção é o Bayern de Munique, que tem uma receita próxima de Real Madrid e Barcelona. Mesmo assim, gasta menos do que esses.
Outra característica da liga alemã é que seus clubes não podem ser comprados por milionários estrangeiros. O controle acionário tem que ser mantido com associações, isto é, aqueles sócios que fazem parte da fundação do clube. Há exceções apenas para times como o Wolsburg porque a Wolkswagen está há mais de 20 anos controlando o time, com raízes ligadas a sua fundação, mesma situação do Bayen Leverkussen. O Red Bull Leipizig gera polêmica por ter um dono recente.
Se não tem investidores milionários, nem gasta os turbos com contratações, como a liga alemã é uma das de maior nível técnico e atratividade do mundo? Um ponto é o desenvolvimento das divisões de base locais, incentivada pela liga e federação alemãs porque os clubes têm que fazer investimentos obrigatórios nos últimos 15 anos. Ora, com a revelação de atletas, os clubes se tornam muito menos dependentes de contratações.
Não é preciso ser um gênio para constatar que o modelo se encaixaria perfeitamente no Brasil. O país é o maior celeiro de jogadores do futebol mundial. Se os clubes tivessem equilibrados financeiramente, e com pequenas mudanças na legislação, seria possível tornar bem mais difícil tirar jogadores do Brasil. Claro, o jogador do nível de Neymar continuará a ir para Barcelonas e PSGs. Mas atletas de talento com bom nível técnico só sairiam por valores bem mais altos do que os atuais, ou não sairiam.
Cada liga europeia identifica o que tem de ponto mais forte. No caso alemão, revelações e fidelidade do time. No caso espanhol, dois times de repercussão global que puxam a liga inteira. No caso inglês, a força econômica de contratos que atingem valores astronômicos. A liga italiana decaiu, mas ainda acha na cultura tática e na Juventus sua força. Mas precisa se reinventar.
O Brasil precisa achar a sua cara, e isso tem que ser na aposta na manutenção de talentos, não no investimento em veteranos a alto custo. Mas, para isso, tem que se aumentar também o gasto com divisão de base. Os clubes nacionais investem a metade dos alemães neste item, e de forma irregular, segundo dados levantados pelo Ministério das Relações Exteriores do Brasil sobre o tema. Ou seja, um São Paulo gasta muito, e outros bem menos, por exemplo. Não há padrão.
Investir em divisão de base e acertar as contas para manter os atletas não dá Ibope e nem títulos imediatos. Mais do que isso, não permite um monte de transações com comissões astronômicas para agentes (e sabe se lá a que outras pessoas no caminho). Exatamente o ciclo vicioso em que está preso o futebol nacional. Os agentes deveriam focar em ganhar dinheiro com a gestão da carreira de seus atletas, não com transações. E os cartolas em desenvolverem planos a longo prazo, não em holofotes momentâneos.
Dado esse primeiro passo, a liga brasileira poderia então formar uma base forte e melhorar o nível técnico para poder ser vendável no exterior como produto inteiro, como campeonato. Atualmente, há pouquíssimo interesse nos jogos do Brasil porque são de baixo nível técnico. Aí, sim, haveria novo salto de receita. De todo esse roteiro, o primeiro passo é que os clubes equilibrem suas finanças. Sem isso, não será possível dar nenhum dos passos seguintes.
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