Diretoria tira Ceni para agradar aliados sem se importar com o Cruzeiro
A demissão de Rogério Ceni do Cruzeiro após um mês e meio não chega a ser um fato raro em um futebol que troca de técnico como um bebê troca de fralda. É o enredo da sua saída que é peculiar e mostra como o clube mineiro se tornou instrumento para atender interesses privados de cartolas e jogadores, e não o que é melhor para o clube e para o torcedor. Assim ocorre desde que Wagner Pires de Sá assumiu a agremiação celeste.
A história começa lá atrás quando foi revelada uma série de irregulares cometidas pela diretoria cruzeirense, e especialmente pelo vice-presidente de futebol do Cruzeiro, Itair Machado. Ele recebia (não se sabe se ainda recebe) um salário milionário de mais de R$ 300 mil por mês durante o ano de 2018, deu comissões inexplicáveis para empresários amigos, gerou dívidas que ameaçam o clube, entre outras medidas fora do comum.
Fragilizado pelas seguidas revelações, Itair era questionado pela torcida que via o Cruzeiro entrar em um buraco financeiro. Quem veio resgata-lo? Thiago Neves, camisa 10 do time e gozando de prestígio com a torcida, dedicou um gol diante do São Paulo ao dirigente, chamou o de amigo e disse que ele fazia bastante para resolver os problemas do clube.
Itair saiu do clube afastado por decisão judicial, e voltou em seguida. Enquanto o cartola viveu seu ostracismo, Mano Menezes saiu da direção técnica do time pelo desgaste por atuações ruins, menos culpa dele do que da diretoria. Para criar um "fato novo", os dirigentes cruzeirenses foram buscar Rogério Ceni no Fortaleza, e ele chegou nos braços da torcida alçado a salvador.
Óbvio que não conseguiria dar uma grande virada em um clube onde os problemas vão muito além do campo. Mas Rogério fazia um trabalho decente no Cruzeiro, tentando consertar o time em meio ao Brasileiro e transforma-lo em uma equipe mais competitiva. Seus obstáculos eram Fred e Thiago Neves porque estes não estavam dispostos a correr para um esquema tático mais intenso – problema, diga-se, que também era enfrentado por Mano Menezes.
Ciente que seria ele o fritado se o time não andasse, Ceni decidiu enfrentar, realizar mudanças, tentar imprimir uma nova cara à equipe. Não seria com um estalar de dedos que isso aconteceria. Mas o Cruzeiro, sim, apresentou alguma evolução a partir do jogo com o Palmeiras, conseguiu enfrentar o Flamengo dentro das suas limitações, e tentar achar uma nova fórmula.
Está claro, no entanto, que isso incomodou jogadores-chave do Cruzeiro como Thiago Neves, e posteriormente Dedé. Rogério era fritado. E o que fez Itair? Aconselhou o ex-goleiro são-paulino a pedir demissão por falta de clima. Ou seja, ele queria atender os jogadores e ainda desejava que o treinador saísse por sua vontade do time, abrindo mão da multa. Acabou forçado a sair – ainda não está claro se demitido ou após se demitir.
É só ver os últimos jogos para constatar que não havia justificativa do rendimento do time para demitir Rogerio. Sua saída, que acentua a crise do Cruzeiro que está na zona de rebaixamento, atende o interesse do Cruzeiro? Itair e Thiago Neves agem pelo bem do Cruzeiro ou para defender a si mesmos? E, de forma mais abrangente, a diretoria cruzeirense está querendo salvar o clube ou proteger seus aliados?
Agora, a diretoria do Cruzeiro terá o desafio de convencer outro técnico a assumir o time com o novo contratado ciente de que terá pouco poder para enfrentar os medalhões do elenco. Será basicamente um gestor de camisas. Não há nenhum ângulo em que se possa enxergar esse cenário como positivo para a agremiação mineira.
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