Só mesmo no país do tapetão para não se reconhecer o Flamengo heptacampeão
O Flamengo conquistou dois títulos relevantes em 23 horas, o Brasileiro e a Libertadores, na jornada mais épica de um clube brasileiro na história moderna. E, ganho o Nacional, vemos a CBF e diversos veículos de comunicação evitando chamar o clube de heptacampeão. Estão baseados em uma decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que diz que o Sport é o campeão de 1987, e não o time rubro-negro.
Bem, esse é um retrato do país do tapetão em que vivemos, onde o mérito é atropelado pela politicagem e pelo juridiquês. No futebol, não há discussão sobre como se deram os campeonatos, quem de fato os venceu e como. Há um apego às filigranas jurídicas e ao interesse de quem está no poder.
Para se chegar a esta constatação, basta dar uma olhada na lista oficial de títulos da CBF. Primeiro, está lá o Sport e não o Flamengo por 1987 pela já mencionada decisão do STF. Ora, ninguém sabe ou lembra do Módulo Amarelo que o Sport venceu em uma disputa de pênalti obscura contra o Guarani, e menos ainda do confronto posterior entre os dois pelo "título". A imposição do cruzamento desse módulo, que reunia uma espécie de segunda divisão, com o Módulo Verde nunca foi aceita de fato pelos times da primeira divisão, vencida pelo Flamengo.
Só uma assinatura imprópria e não autorizada de Eurico Miranda, vice do rival Vasco, que aceitava a mudança de um regulamento do Brasileiro no meio do campeonato. Sim, é isso que esperam que aceitemos como correta: uma mudança de regras no meio da competição, não aceita pelos participantes. O STF nunca discutiu esses méritos, só debateu teses jurídicas.
Continuemos a analisar a lista de campeões nacionais. Está lá o Palmeiras com dez títulos. Neste caso, a CBF colocou o decampeonato para se referir ao time alviverde no ano passado. Desses, quatro títulos foram duas Taças Brasil, dois Roberto Gomes Pedrosa que a confederação equiparou ao Brasileiro em dezembro de 2010.
Ora, quem decidiu por essa oficialização foi o presidente da CBF, Ricardo Teixeira, cujo passado o condena como todos sabemos. Como se deu essa decisão? Um historiador a pedido dos seis clubes beneficiados fez um dossiê – aqui o colega Juca Kfouri conta como era "sério" o dossiê. A confederação, que não tinha nenhum departamento técnico ou histórico estruturado para tratar dessas questões, aceita o trabalho e chancela todas as taças.
Isso ocorre em um cenário em que Teixeira queria o apoio de clubes para um empreitada de assumir o poder ou implodir o Clube dos 13, juntamente com o presidente do Corinthians, Andrés Sanchez. Em abril de 2010, o ex-presidente do Flamengo Kléber Leite, candidato do grupo de Teixeira e Sanchez, perdera a eleição do Clube dos 13 para Fábio Koff. Em dezembro de 2010, a CBF decide oficializar todos os títulos. Em fevereiro de 2011, Andrés e Teixeira conseguem acabar com a instituição.
Dos seis times que ganharam títulos da confederação, cinco apoiaram o final do Clube dos 13. Claro que este não era o único motivo, houve uma guerra de interesse na época que envolveu diversos outros fatores. Mas é fato que era um cenário em que interessava à CBF agradar ao máximo os clubes.
E o mérito esportivo desses torneios? Essa é uma discussão longa e o meu colega PVC é provavelmente quem a abordou de melhor forma. Mas, resumindo, a transformação da Taça Brasil em Brasileiro é completamente absurda sob qualquer critério esportivo. Já a oficilização do Roberto Gomes Pedrosa, o Robertão, gera uma discussão, um caso de "pênalti intepretativo", sendo possível adotar as duas posições com bons argumentos. Aqui neste blog entendo que não são Brasileiros, mas aí pode se pensar diferente de forma correta também.
Por que a transformação da Taça Brasil em Brasileiro é um absurdo? Peguemos os exemplos das edições de 1960 a 1964. Santos e Palmeiras jogaram entre quatro e seis partidas em cada um desses torneios. Entraram, na maior parte dos casos, na semifinal do torneio por critérios da CBF na época. É justo comparar uma competição dessas com um campeonato de 38 longas rodadas em que o time tem que se esforçar por uma temporada inteira para vencer? Isso vale também para os campeonatos das décadas de 70, 80 e 90, que não eram pontos corridos, mas tinham longas disputas.
Não faz o mínimo sentido, portanto, pelo mérito esportivo, igualar isso ao Brasileiro. Mas quem se importa com o mérito no país dos tapetões?
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